Quando acaba a terapia?
- Gabriel Fernandes de Oliveira
- 18 de out. de 2021
- 4 min de leitura
Atualizado: 7 de abr. de 2022
Há um movimento positivo nas redes sociais que tem naturalizado e desmistificado as psicoterapias e análises. As pessoas tem reconhecido mais a necessidade de apoio profissional com questões de saúde mental e diminuído preconceitos contra esse trabalho. Naturalmente muitas questões tem surgido sobre esse trabalho mostrando interesse e valorização das pessoas sobre o campo. Quando se trata de terapia algumas perguntas que parecem simples de responder não são, mas podem ser ótimos convites para reflexão. Uma dessas perguntas é quando termina a terapia?

Cheguei a escrever nesse site que é quando os objetivos que te levaram a terapia são alcançados e você não tem novos objetivos nela. Isso até acontece com algumas pessoas, mas não com todas.
Algumas pessoas vem na terapia com um objetivo e durante o processo se dão conta de que tinham outros objetivos mais importantes. Outras pessoas vem com um objetivo evidente, bem delineado e o seu processo tem a ver com a desconstrução desse objetivo e abertura para outras possibilidades. E tem aquelas pessoas que não vem com um objetivo tão evidente, mas que ao longo do processo constroem esse objetivo.
Minha professora brincava em sala de aula perguntando à turma dizendo que a resposta do psicólogo à todas perguntas que chegam nele é depende. Por mais cômico e clichê que isso possa ser, hoje não vejo outro modo de ser mais justo com a complexidade das pessoas. Quando eu digo que depende, me recuso a colocar uma regra que coloque todos na mesma caixa e abro espaço para as nuances e diferenças entre as pessoas.
Então quando me perguntam quando uma terapia acaba, digo que depende de diversos fatores, como: que motivo levou essa pessoa a começar uma terapia? Que relação se estabeleceu entre essa pessoa e seu terapeuta? Que questões vieram a tona durante a terapia e quais delas vão ser trabalhadas em terapia?
Essas perguntas convidam a olhar para as diferentes pessoas que fazem terapia, suas diferentes histórias e as diferentes relações que estabelecem com seus terapeutas.
O encerramento da terapia pode ter a ver com alguém
- que encontrou aquilo que procurava,
- que encontrou algo que nem procurava,
- que se deu conta que não vai encontrar ali o que procura,
- que se deu conta que não quer mais procurar aquilo que buscou ali,
- que atravessou aquelas questões que mais atrapalhavam a vida
Mas pode ter a ver com nada disso
Os motivos que levam alguém à terapia não necessariamente são os mesmos motivos que mantém alguém na terapia
Considero que não tem como responder quando é o fim da terapia de uma pessoa sem responder o que mantém essa pessoa fazendo terapia. E essa resposta varia para cada um e quem pode responder, em primeiro lugar, é o próprio paciente.
Autoconhecimento
Uma psicoterapia ou uma análise é um espaço privilegiado para o processo de autoconhecimento, pois há coisas que só podemos conhecer em nós quando estamos em contato com outra pessoa, e um psicólogo ou psicanalista é especialista em lançar um olhar minucioso e respeitoso sobre alguém.
Talvez por isso esse autoconhecimento seja algo que mantém as pessoas em terapia. Como é um processo contínuo, sempre podemos nos deparar com algo novo sobre nós mesmos. E como a terapia e a análise são espaços privados e cuidadosos, é possível experimentar autoconhecimento com maior segurança.
Os momentos mais transformadores que testemunhei dos meus pacientes tiveram a ver com situações em que se olharam de uma forma diferente e viram coisas que não tinham percebido antes, coisas que foram possíveis ali durante a terapia.
Quando, por meio de um processo de autoconhecimento, nos percebemos melhor surge algo potente como a possibilidade de decidir o que fazer com isso. As vezes vivemos vidas acorrentados a regras que nem percebemos e nos machucam. Quando nos damos conta dessas correntes, podemos até continuar com elas mas dessa vez sabendo disso, cientes, advertidos.
Diferentes respostas
Cada abordagem tem um entendimento diferente do que é uma psicoterapia, o que é uma patologia e o que é um tratamento. Apesar das diferenças todas se ocupam dessas questões para conduzir um processo terapêutico e de acordo com cada uma o fim da terapia é diferente.
Hoje, minha resposta é que a terapia vai no sentido de aproximar a pessoa daquilo que ela quer, conhecer as regras pelas quais ela vive sua vida, atravessar os obstáculos desse processo e dar condições para que viva sua vida segundo seus próprios termos.
Falo aos meus pacientes que eu trabalho pra não ser mais necessário, e que quem diz sobre essa necessidade primeiramente são eles.
Minhas terapias
Fiz 5 anos de terapia e 2 anos de análise. Nesse tempo tive o prazer de compartilhar esse processo com 4 profissionais diferentes, cada um com uma perspectiva singular sobre minha história e minhas questões.
O fim da relação com um profissional não significa o fim do processo terapêutico. Quando penso numa metáfora, me vem a imagem de navegar sem mapa em direção ao horizonte como o processo de autoconhecimento. Nessa situação, os psicoterapeutas seriam como os faróis. Não consigo enxergar o fim do horizonte da mesma forma que não consigo enxergar o fim da minha terapia.
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